sexta-feira, 14 de novembro de 2008

A escala da honestidade

Escrever sobre a honestidade não traz nenhuma dificuldade do ponto de vista do seu significado. Contudo, escrever sobre a escala da honestidade, este sim, exige quase uma mágica e mirabolante explicação que encontram raízes na cultura brasileira, identificado como o "jeitinho brasileiro". A alta safra de exemplos que colocam em risco a convivência ética entre os brasileiros, inspira-me a arriscar essa abordagem.
O cinismo tem reinado de forma surpreendente, a hipocrisia tem sido feroz concorrente.
E a desonestidade?
Ah!! Essa, sim, lidera o pódio, nesse campeonato implacável e voraz. A mim parece quanto mais penso que o incentivo à supremacia dos valores da "esperteza", do "tirar vantagem" de tudo é perfeitamente detectável pela fragilidade em homens e mulheres que não lhes permitem ser suficientemente corajosos para se manterem honestos e imunes à Síndrome do Medo de Serem Taxados de Idiotas (SMTI).

Considerando esse quadro, nada mais oportuno do que "elastecer" o conceito de honestidade para julgar, em certos casos, pejorativamente, alguém como Muito Honesto e excluí-lo do "mundo dos espertos" ou, abrandando o julgamento, classificá-lo como Mais ou Menos Honesto ou Pouco Honesto. Observem que esta gradação tem um sentido implícito de exclusão (se muito honesto) de adaptação (se mais ou menos honesto) e de inclusão (se pouco honesto).

Mas o que vem a ser a Escala da Desonestidade?

Arrisco a conceituá-la como uma métrica classificatória de níveis de honestidade: Muito Honesto, Mais ou Menos Honesto, Pouco Honesto. Soou estranho ao leitor?

À primeira vista "Muito Honesto" parece ser uma redundância da honestidade, contudo, não se trata disto. Significa, no contexto brasileiro, identificar alguém que sofre da Síndrome da Honestidade Inconveniente (SHI). Em outras palavras, quem é afetado por essa "enfermidade", será radicalmente afastado, isolado, como se tivesse contraído uma doença com capacidade de contagiar os Mais ou Menos Honestos. Nesse caso, a qualidade de ser Muito Honesto tem a conotação de exclusão.

E o Mais ou Menos Honesto? Ah!, essa situação é mais complicada mas não indecifrável. Em primeiro lugar, o Mais ou Menos Honesto está enquadrado na Síndrome de Honestidade Oscilante (SHO). Os sintomas desta peculiar disfunção manifestam-se em comportamentos ora desonestos, ora honestos, o que significa que alguém acometido dessa síndrome pode vir a se sentir plenamente à vontade para praticar atos ilícitos e num outro momento, ser afetado por crises de consciência e até arrepender-se. O detentor da Síndrome de Honestidade Oscilante (SHO) não sofrerá a exclusão total, mas estará sob permanente vigilância, afinal a "banda" honesta é ameaçadora. Falemos agora do Pouco Honesto.

Considerando os outros níveis, este está a um passo da desonestidade, portanto, tem um perfil quase perfeito para a inclusão no ambiente das improbidades gerais. Neste caso, há raríssimos sintomas de consciência honesta. Diria que aquele que se encontra nesse estágio tem fortes possibilidades de passar para o lado da "Desonestidade". Esse nível, na escala da honestidade, pode ser classificado como a Síndrome da Tendência à Desonestidade (DTD).

Creio que essas significações têm um quê de intencionalidade enrustida e de extrema sutileza. Não é um simples emprego de advérbio com grau de intensidade. É, na essência, uma mirabolante e ardilosa manobra para abrandar aos olhos da sociedade, o cenário de proliferação galopante da desonestidade, ou opção inconsciente por mecanismos adaptativos ao caos moral, no qual a sociedade sobrevive. Pelo sim ou pelo não, o certo é que temos enfrentado um momento singular, no qual empregar conceitos e definições, torna-se cada vez mais complicado, exigindo de nós, a utilização de lingüística mirabolante, adaptando-a, muitas vezes, aos interesses contextuais desprezíveis.

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